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Democracia, um tremendo mal-entendido


Em seu livro Raízes do Brasil, Sérgio Buarque de Holanda afirmou que “para nós a democracia é um tremendo mal-entendido”. Ele estava certo e não só entre nós é assim como em toda América Latina. Pelo menos foi isso que demonstrou pesquisa realizada pela organização Latinobarómetro sediada no Chile, entre 18 de julho e 28 de agosto deste ano. Neste período foram ouvidas 18.638 pessoas em 17 países latino-americanos e para 28% dos entrevistados a democracia não satisfaz, sendo que 52% não se importaria de ser submetido a um governo não-democrático desde que ele resolvesse os problemas econômicos. Essa opinião é mais forte no Brasil e no Paraguai onde 55% e 60% respectivamente se diz não-democrata. No restante da América Latina o índice é de 39%.
No caso da economia de mercado, o índice de satisfação é de apenas 16%. Isto porque as pessoas não se sentem incluídas dado o alto índice de desemprego e de pobreza na região. Segundo ainda a Latinobarómetro, a crescente visão da democracia e do mercado como “incompetentes” abre espaço para a instabilidade política na América Latina. Neste contexto se insere a queda do presidente boliviano, Gonzalo Sánchez de Lozada, em 17 de outubro, pressionado que foi pelo movimento que se opunha ao plano do governo de exportar gás natural para os Estados Unidos por meio de um porto Chileno. No embalo do sucesso da deposição de Lozada, o líder dos plantadores de coca, Evo Morales, discursou sobre o olhar atento de Fidel Castro numa conferência latino-americana sobre ciências sociais. Disse o líder cocalero que, obviamente, não aceita os programas patrocinados pelos Estados Unidos para erradicar a folha que produz a cocaína:
“Acredito que, com a criação do poder popular e a conquista da unidade latino-americana, com a clareza necessária para derrotar o imperialismo, possamos, dentro em breve, comemorar a transformação da América Latina num novo Vietnã para os Estados Unidos”.
Tudo indica que a América Latina está dando uma guinada para a esquerda e isso pode ser comprovado através das eleições que no Brasil, Argentina, Peru e Equador conduziram ao poder máximo de suas respectivas Repúblicas líderes esquerdistas, de tendência populista e marcadamente anti-americanistas. Com eles fortaleceram-se Fidel Castro e Hugo Chávez, sendo que na Bolívia o levante que derrubou o presidente Lozada tende nitidamente a impor o tipo de esquerda aclimatada a estes "tristes trópicos".
Pode ser também observada a movimentação mais intensa de grupos anarco-guerrilheiros, como as Farc da Colômbia, o Sendero Luminoso do Peru, enquanto que no Brasil recrudesce a onda de invasões do MST, movimento que tem como meta não mais a reforma agrária mas utiliza métodos revolucionários de esquerda para a tomada do poder.
Assim, na senda palmilhada por antigos caudilhos e trilhada com gosto pelo autoritarismo, tanto da parte dos governantes quanto dos governados, continua a caminhar a América Latina. Ressurge aqui e ali o mito do “bom revolucionário” e, na impossibilidade de resolver contradições, mazelas e fracassos, descarrega-se frustrações sobre os que na América deram certo: Os Estados Unidos. Não passa pela cabeça dos latino-americanos atribuir a culpa do que são nem a si mesmos nem a seus governos incompetentes, corruptos, autoritários ou, no máximo, oligárquicos.
Afastando-se do que poderia levar a processos desenvolvimentistas, ou seja, a sistemas democráticos inseridos na globalização e com atuação incisiva no mercado competitivo, a América Latina se satisfaz com seus grandes Estados paternalistas, patrimonialistas, clientelistas, xenófobos. Por uma questão de mentalidade os latino-americanos seguem endeusando seus modernos caudilhos que, prometendo a redenção dos miseráveis aprofundam a miséria, perpetuam as desigualdades sociais, inibem a possibilidade de progredir de seus povos, atrasam o destino de suas nações. Como disse Símon Bolívar: “Se acontecesse que uma parte do mundo voltasse ao caos primitivo, isso seria a última metamorfose da América Latina”.

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