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Enunciado 82-FVC: Não se pode impedir o protesto de nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito 05/08/2015

Enunciado 82-FVC: “Não se pode impedir o protesto de nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito” (unânime)


 


Justificativa:


         A jurisprudência que desconsidera o contrato de abertura de crédito como título executivo, ainda que acompanhado dos demonstrativos da evolução do débito, tornou-se majoritária, acabando por constituir Súmula do Superior Tribunal de Justiça, de seguinte teor:


"Súmula 233: O contrato de abertura de crédito ainda que acompanhado de extrato da conta-corrente, não é título executivo".


         Posteriormente, a Corte superior entendeu que a iliquidez que retira a força executiva do contrato de abertura de crédito transfere-se à nota promissória dada em garantia do negócio. A iliquidez que macula o contrato também atinge a nota promissória, por derivar da mesma relação obrigacional. Foi editada, então, nova Súmula representativa dessa extensão conceitual, nesses termos:


"Súmula 258: A nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito não goza de autonomia em razão da iliquidez do título que a originou".


         A jurisprudência expressa nas súmulas, todavia, não deve servir de lastro para pretensão de se anular o título (nota promissória) ou impedir que seja protestado. Atualmente temos observado que, servindo-se dela, as partes que negociaram esse tipo de contrato com bancos estão tomando a iniciativa de ingressar em juízo e requerer a anulação do título e o impedimento do protesto, antes mesmo de sofrerem a promoção de eventual processo executivo. A jurisprudência em questão não autoriza esse tipo de pretensão, porquanto se limita a impedir que a nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito enseje processo executivo. O título evidencia a exigibilidade da dívida, e deve continuar servindo para esse desiderato, por outros meios processuais (como a ação monitória ou de cobrança). De posse do título (nota promissória) e os extratos comprobatórios da disponibilidade do crédito, o banco pode promover a cobrança da dívida por esses outros meios, os quais conferem maior largueza procedimental para realizar eventual apuração ou acertamento, se necessário, inclusive com base em outras provas. Assim, não é correto se conceder medidas judiciais para simplesmente anular ou impedir o protesto de nota promissória, pela simples razão de ser vinculada a contrato de abertura de crédito, porquanto isso implicaria na prática em eliminar a exigibilidade da dívida (ainda que ilíquida) representada pelo título.


         A jurisprudência do STJ, representada pela Súmula 258, dever ser recepcionada no sentido de que pode existir formalmente um título de crédito, mas que não seja apto a propiciar um processo de execução. Em outras palavras, além de se enquadrar em algumas das figuras predispostas nos incisos do art. 585 do CPC, para adquirir força executiva é necessário que o documento (representativo da dívida ou obrigação) ainda apresente as características de certeza e liquidez (como exigido pelo art. 586). Em suma, podemos nos deparar com um documento que satisfaça os pressupostos formais de um título de crédito, mas que, por não fornecer nele próprio os elementos para que se possa aferir a liquidez do débito, não pode ser tido como título executivo.


         É o caso da nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito, uma vez que o objeto desse tipo contratual é a disposição de certo numerário, dentro de um limite prefixado. A nota promissória não é sacada como representativa do débito, mas como garantia de seu pagamento. A indeterminação antecipada do quantum devido, falta de liquidez característica do contrato de abertura de crédito, é transmitida à nota promissória vinculada, impedindo que seja utilizada para fins de execução, somente isso. O título de crédito vinculado ao contrato permanece formalmente válido, com força documental para outros fins, não servindo apenas para aparelhar processo de execução. A única imprestabilidade da nota promissória assim emitida, ou seja, vinculada a contrato de abertura de crédito, é não poder servir como instrumento da execução, dada a falta de liquidez, como já vimos. Mas se o título e o contrato a que está vinculado não atestam documentalmente a "liquidez" da dívida, requisito formal da execução (art. 586 do CPC), é certo que eles evidenciam sua exigibilidade. Servem para comprovar a existência do negócio jurídico e seus efeitos, dentre os quais a obrigação de pagamento, a circunstância de ser exigível a dívida (não paga) do correntista. A nota promissória continua sendo um título de crédito, ou seja, um documento representativo de uma obrigação e emitido de conformidade com a legislação específica.


         Esse realmente é o entendimento adequado e que respeita o conteúdo das Súmulas do Superior Tribunal de Justiça (Súmulas 233 e 258). Por força da orientação jurisprudencial contida nessas súmulas, a nota promissória permanece válida, sendo apenas retirada do credor a via executiva. Os demais efeitos decorrentes da existência do título permanecem válidos, preservando-se inclusive as demais qualidades que marcam os títulos cambiariformes, como a literalidade e a cartularidade. Quando se menciona que a nota promissória vinculada a contrato de crédito rotativo perde sua autonomia, apenas se está a indicar que não se presta a propiciar, de forma isolada, processo executivo.


         As Súmulas 233 e 258 não autorizam, portanto, interpretação que permita concluir que os títulos (contrato de abertura de crédito e nota promissória) sejam nulos ou despidos de qualquer efeito creditício ou cambiariforme. Não se pode pretender a nulidade da nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito em conta corrente, nem retirar do credor a legitimidade para o protesto, porquanto o título continua a existir validamente, representativo de dívida não paga. Todos os demais efeitos decorrentes da existência do título permanecem incólumes. Não é correto, por conseguinte, conceder cautelar ou qualquer outra medida judicial para impedir o protesto de nota promissória com apoio exclusivamente no conteúdo das mencionadas súmulas (233 e 258).


         O protesto cambial não é uma espécie de fase pré-processual da ação executiva. Trata-se de medida extrajudicial, sem natureza processual civil. Pode ser definindo como a formalidade destinada a servir de prova da impontualidade no pagamento de obrigação constante de título de crédito ou documento de dívida. Mas além desse efeito probatório, o ato de protesto tem outras finalidades, como explica Pedro Nolasco de Araújo, que aponta também os seguintes efeitos para o ato em questão:coercitivo, constitutivo, público e regressivo. De fato, lembra ele que o instrumento de protesto não se limita a servir como prova da impontualidade do devedor (efeito probatório), mas também para coagir com a ameaça da falência (efeito coercitivo), constituir em mora o aceitante (constitutivo), dar publicidade do fato a terceiros (público), e para possibilitar o exercício do direito de regresso contra os coobrigados (regressivo). Observa-se, portanto, que o protesto produz não só efeitos entre as partes mas também perante terceiros. Entre as partes, caracteriza a impontualidade, o descumprimento da obrigação, faz surgir a mora e o atraso culposo. Perante terceiros, revela a inidoneidade financeira ou insolvabilidade. Ao se vedar que a nota promissória (vinculada a contrato de abertura de crédito) seja levada a protesto, vai se impedir a produção de todos esses efeitos que resultam do ato, o que certamente não foi o que se pretendeu ao editar as Súmulas do STJ (233 e 258). A obstrução ao protesto configura uma proibição à salvaguarda de direitos cambiários.


         Mesmo que se entenda que a inteligência das Súmulas reside em retirar qualquer efeito cambiário de nota promissória emitida nessas circunstâncias, desnaturando-a por completo como título de crédito, ainda assim não se poderia impedir o protesto da cártula. É que a Lei que regula o protesto cambial (Lei n. 9.492/97) prevê a possibilidade de sua realização em relação a uma infinidade de situações não abrangidas pelos títulos de crédito, conforme se depreende de seu art. 1º., assim redigido:


"Art. 1º. Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida."


         Nessa direitura, ainda que não se considere título de crédito, a nota promissória vinculada a contrato de crédito rotativo é, inegavelmente, um documento que representa dívida, sendo, portanto, protestável nos termos da Lei supra transcrita.


         É realmente inconcebível se pretender que o devedor, assim compreendido o emitente de nota promissória ou indicado pelo credor como responsável pelo cumprimento da obrigação, não possa figurar no termo de lavratura e registro do protesto. As Súmulas do STJ (233 e 258) tão somente proclamam que a falta de liquidez da dívida constante de nota promissória vinculada a contrato de crédito rotativo impede que o credor dela se utilize para promover processo executivo, mas em nenhum momento reconhecem a extinção da obrigação. Para que se possa cancelar o registro de protesto é necessário que a decisão judicial reconheça a própria extinção da obrigação. Portanto, obstar o protesto de título ou documento de dívida sem reconhecimento da própria extinção da dívida equivale a desmantelar a regularidade dos serviços cartorários concernentes ao protesto, anulando as garantias de autenticidade, publicidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.